Conceito e Definição
“O Distúrbio ou Transtorno de Aprendizagem afeta o modo pelo qual crianças com inteligência média, ou acima da média, recebem, processam ou expressam informações que se mantém por toda a vida. Isso prejudica o desenvolvimento de habilidades básicas em leitura, escrita ou matemática”.
DEFINIÇÃO
CRITÉRIOS DO DSM V
a) O rendimento do indivíduo na leitura, cálculo ou expressão escrita, avaliados mediante testes normalizados e administrados individualmente situa-se significativamente abaixo do esperado, considerando-se idade cronológica do sujeito, seu coeficiente intelectual e a escolaridade própria da sua idade.
b) A alteração do critério interfere significativamente no rendimento acadêmico ou nas atividades da vida cotidiana que exigem habilidades para a leitura, cálculo ou escrita.
Diacalculia - Dificuldades de aprendizagem da Matemática
De acordo com o código internacional de doenças (CID 10), os transtornos de aprendizagem “(…) são transtornos nos quais os padrões normais de aquisição de habilidades são perturbados desde os estágios iniciais do desenvolvimento. Eles não são resultado de uma falta de chance de aprender nem são decorrentes de qualquer forma de traumatismo ou de doença cerebral adquirida. Ao contrário, pensa-se que os transtornos originam-se de anormalidades no processo cognitivo, que derivam em grande parte de algum tipo de disfunção biológica”. (CID – 10,1992: 236).
Dentre os transtornos de aprendizagem, existe uma “condição perseverante que afeta a aquisição das habilidades matemáticas” que tem sido denominada discalculia (Department for Education and Skills, 2002,Chinn, 2007).
Discalculia ou DAM – Dificuldade de aprendizagem da matemática é um déficit de aprendizagem persistente em matemática (BUTTERWORTH, 2005). A prevalência da discalculia de acordo com a literatura varia entre 3 e 11% e, naturalmente, depende da amostra selecionada mas, usualmente, é tida como 5%.
O DAM tem etiologia multifatorial (WILLCUTT, 2010), uma causa importante dez respeito a síndromes de etiologia ambiental e genética. Algumas síndromes têm dificuldades com aritmética na sua expressão fenotípica, tais como embriopatia alcoólica, síndrome de Turner, síndrome velocardiofacial e hidrocefalia congênita precocemente tratada. A comorbidade entre dificuldades de aprendizagem de aritmética e outros transtornos da aprendizagem é mais regra que exceção (RUBINSTEIN e HENIK, 2009). A comorbidade é alta, principalmente com a Dislexia e o Transtorno do Déficit de Atenção por Hiperatividade (TDAH).
O processamento fonológico desempenha sua função na aquisição da matemática em aspectos que dependem do emprego de códigos verbais, porém seu papel é sobreposto pelo processamento executivo e pela memória de trabalho.
A importância da memória de trabalho na aprendizagem da aritmética está bem estabelecido (RAGHUDAR et al., 2010). O modelo teórico mais largamente aceito é o componencial (BADDELEY, 2001). Este modelo pressupõe que a memória de trabalho
é composta por sistemas escravos concebidos por uma alça fonológica, por um bloco de notas visoespacial e por um buffer episódico, e por um executivo central. O
executivo central é principalmente importante por sustentar dados durante um curto período de tempo, agregar informações dos sistemas escravos, bem como manter contato com a memória de longo prazo.
A importância das habilidades de processamento visoespacial refere-se principalmente ao cálculo multidigital mental ou escrito (HARTJE, 1987). Os erros de procedimento em operações multidigitais de cálculo por escrito, tanto em crianças quanto em pacientes com acalculia, são decorrentes de disfunção do processamento visoespacial, e se referem principalmente a dificuldades em operações de troca e empréstimo entre uma coluna e outra e alinhamento de colunas. A memória de trabalho visoespacial pode ser mais importante no início da aprendizagem da aritmética, e à medida que avança no currículo fatores fonológico são mais importantes.
A partir de pesquisas envolvendo a aquisição do conceito de numerosidade em seres humanos e animais, Dehaene (1997) propôs que o desenvolvimento de um “senso numérico” ou de uma habilidade simbólica para números é muito precoce nos seres humanos. Há, inclusive, evidências de atividade elétrica cerebral em lactentes de 3 meses, em reação à mudança do número e da identidade dos objetos (Izard; Dehaene-Lambertz; Dehaene S., 2008).Uma disfunção nesta habilidade ou senso numérico seria o cerne da discalculia. Esse transtorno específico tem sido denominado “discalculia do desenvolvimento”.
O senso numérico ou acuidade numérica simbólica pode estar comprometido em pessoas com DAM, não se conhece, porém a frequência que este déficit ocorre, seu poder preditivo com relação a outras variáveis, mas este é mais importante no início da aprendizagem da matemática.
Assim como na dislexia, a discalculia de desenvolvimento só pode ser suspeitada na presença de coeficiente intelectual (QI) normal, na ausência de lesões neurológicas e na presença de exposição a ensino formal da matemática.
As dificuldades usualmente encontradas na discalculia são:
Além do funcionamento cerebral e da genética, o mau ensino, o currículo pobre e a ansiedade matemática generalizada podem colaborar para o quadro da discalculia, mas não são a causa da discalculia do desenvolvimento (Shalev, 2003).
É importante observar que mesmo na presença dessas dificuldades, pessoas portadoras de discalculia do desenvolvimento tem inteligência dentro ou acima da média (Dehaene, 2004).
Em termos acadêmicos, um aluno com discalculia poderá apresentar:
• Dificuldade para entender conceitos numéricos simples (tais como o local/valor e o uso das quatro operações);
• Falta de conhecimento intuitivo sobre números (valor e relação entre os números);
• Dificuldades para aprender, evocar e/ou usar fatos e procedimentos numéricos (ex.: tabuada, divisões longas);
• Mesmo que estes alunos produzam uma resposta correta ou usem um método correto, eles comumente o fazem de maneira mecânica e sem confiança.
A construção do conhecimento matemático pressupõe que se tenha domínio prévio do conteúdo, ou seja, é um processo essencialmente sequencial e de formação de padrões, em outras palavras, é um processo de metalinguagem.
Por esse motivo, as dificuldades presentes na discalculia persistem mesmo quando há domínio do procedimental, pois são dificuldades no entendimento conceitual e na aplicação do conhecimento do procedimento em novas situações-problema. Quando as dificuldades apresentadas na matemática são apenas de natureza procedimental considera-se que são resultantes de um aprendizado insuficiente da matemática e não de um transtorno de aprendizagem, como a discalculia.
Do ponto de vista do neurodesenvolvimento, a literatura (Kosc, 1974, 1986), revela que a discalculia do desenvolvimento reflete uma desordem estrutural (de origem genética ou congênita) das partes do cérebro que são o substrato anátomo-fisiológico da maturação das habilidades matemáticas, sem um transtorno simultâneo das funções mentais gerais.
O lobo parietal exerce papel predominante no processamento numérico (especialmente o sulco intraparietal em ambos os hemisférios) e há evidências (exames de imagem) de um recrutamento insuficiente de neurônios no processamento de magnitudes análogas de números nessas regiões (Fias et al. 2003; Dehaene, 2007).
A discalculia é uma condição permanente, portanto, o aluno e sua família necessitam de apoio e orientação. Pesquisas indicam que alunos com transtornos de aprendizagem têm mais sucesso no ensino superior quando desenvolveram sólidas habilidades de expressar suas vontades e ideias.
Dentre as habilidades de auto-conhecimento importantes de serem estimuladas nos alunos com transtornos de aprendizagem, poderíamos citar:
• Conhecimento da sua forma de aprendizagem,
• Habilidade de articular suas necessidades de aprendizagem,
• Habilidade para comunicar essas necessidades aos outros.
Preferencialmente, o diagnóstico da discalculia deve ser realizado em equipe multiprofissional, envolvendo avaliações nas áreas da neuropediatria, neuropsicologia, fonoaudiologia e psicopedagogia. Quando necessárias avaliações adicionais são solicitadas (oftalmologia, psiquiatria, entre outros).
FONTE
Capovilla, Avaliação e Intervenção Metafonológica em Distúrbios de Linguagem Escrita, 2004.
Capellini, Tópicos em Transtornos de Aprendizagem, 2011.
Capellini, Tópicos em Transtornos de Aprendizagem II, 2011.
Silva, W. C., Discalculia: uma abordagem à Luz da Educação da Matemática, 2008.
Passos, A. Q., Cazella, A. V., Araman, E. M. O. e Grossi, E. S. D., A Dificuldade de Aprendizagem em Matemática: Discalculia, 2014.
Dislexia do Desenvolvimento: Definição, Intervenção e Prevenção
Cerca de 10% das crianças em idade escolar apresentam distúrbios de leitura e escrita de forma severa; considerando os distúrbios leves, este percentual pode chegar a 25%.
“A DISLEXIA DO DESENVOLVIMENTO é um distúrbio em que a criança, apesar de ter acesso à escola regular, falha em adquirir as habilidades de leitura, escrita e soletração que seriam esperados de acordo com seu desempenho intelectual”, World Federation of Neurologists (1968). “É um dos vários distúrbios de aprendizagem”, National Institute of Health AMERICANO. “É um distúrbio específico de linguagem de origem constitucional e caracterizado por dificuldades em decodificar palavras isoladas, geralmente refletindo habilidades de processamento fonológico deficientes. Essas dificuldades em decodificar palavras isoladas são frequentemente inesperadas em relação à idade e outras habilidades cognitivas e acadêmicas, elas não são resultado de um distúrbio geral do desenvolvimento ou de problemas sensoriais” (ORTON DYSLEXIA SOCIETY, 1995, p. 2).
A Dislexia caracteriza-se por um distúrbio de linguagem expressiva e ou receptiva que não pode ser atribuída a atraso geral do desenvolvimento, distúrbios auditivos, lesões neurológicas importantes (paralisia cerebral e epilepsia) ou distúrbios emocionais (TALLAL et al, 1997).
A Dislexia ainda pode ser compreendida com sendo resultado de uma interação entre aspectos biológicos, cognitivos e ambientais que não podem ser separados uns dos outros (FRITH, 1997).
A adaptação da criança frente a dificuldades em leitura e escrita também depende de fatores como motivação, reações afetivas, habilidades intelectuais gerais, idade e condições sociais (CAPOVILLA, 2002).
A Dislexia não possui uma causa específica, existe, portanto, um somatório de fatores.
Dois métodos de alfabetização são indicados para pessoas disléxicas: o método Multissensorial (indicado para crianças mais velhas, com história de fracasso escolar) e o método Fônico (para crianças mais jovens, devendo ser introduzido no início da alfabetização).
O Método Multissensorial une várias modalidades auditiva, visual, cinestesica e táctil, facilitando a leitura e a escrita, estabelecendo conexões entre todos estes aspectos além de proporcionar mais entradas sensoriais. Maria Montessori (1948) é uma de suas precursoras, Orton e Pamela também propuseram variações deste método.
O Método Fônico tem como objetivos: o desenvolvimento de habilidades metafonológicas e o ensino das correspondências grafofonêmicas. Sua base teórica é que crianças Disléxicas têm dificuldades para discriminar, segmentar e manipular, de forma consistente, os sons da fala, problema que pode ser minimizado de forma significativa com a introdução durante, ou mesmo antes da alfabetização, de um programa de atividades especifica e sistemática de Consciência Fonológica.
Nas diretrizes da British Dyslexia Association, este método é recomendado, os alfabetizadores são recomendados a desenvolver atividades de rima, segmentação fonêmica, discriminação de sons e a ensinar as correspondências entre letras e sons. É importante perceber que esta orientação é dada em países de língua inglesa, cuja base fonológica é muito irregular. Assim, se o Método Fônico é indicado para língua inglesa, este será muito mais eficaz no Português, em que as relações fonológicas são bem mais frequentes. A utilização de atividades fônicas e metafonológicas têm sido introduzidas em vários países, como Alemanha, França, Austrália, Canadá, Dinamarca, Estados Unidos, Noruega e Suécia (CAPOVILLA e CAPOVILLA, 2004).
Pesquisas também têm demostrado que é possível intervir de forma preventiva com crianças de risco para Dislexia, de forma a amenizar sua severidade (BALL e BLACHMAN, 1991). Estudos também demonstram a importância do atendimento precoce para diminuição de sequelas futuras (OLSON et al, no prelo).
Borstrom e Elbro (1997) implementaram uma pesquisa com crianças de pais DISLÉXICOS, buscando responder às seguintes questões: é possível desenvolver a consciência fonológica em crianças pré-escolares cujos pais são DISLÉXICOS ? E a introdução da consciência fonêmica pode diminuir a incidência de Dislexia? Os resultados sinalizaram que a intervenção na pré-escola em crianças de risco para Dislexia reduz em 17% e diminui em 50% o risco de Dislexia em séries posteriores, as crianças têm uma tendência, portanto, a responder de forma eficaz ao que lhes é ensinado.
Praticas globais, como no Brasil, que dão pouca ênfase ao ensino da Consciência Fonológica, tendem a aumentar a discrepância entre crianças de risco para Dislexia e as com boas habilidades linguísticas.
Assim, torna-se imperativo que atividades fônicas e metafonológicas sejam aliadas a práticas pedagógicas em sala de aula, e por profissionais da área psicoeducacional em suas atuações clínicas e orientação escolar (CAPOVILLA e CAPOVILLA, 2004; CAPOVILLA et al, 2005; JARDINI, 2003; OLIVEIRA, 2003) todos estes estudos concordam que estas práticas ajudam a prevenir e a intervir em dificuldades na aquisição da leitura e escrita.